
A China Hub Brasil – associação sem fins econômicos que deu cargo de presidente de honra para o mais novo ministro da Saúde, Alexandre Padilha – conta com apoio e patrocínio de peso de gigantes chinesas e brasileiras que possuem interesses comerciais no governo Lula, sobretudo na pasta agora comandada por Padilha.

A entidade será lançada oficialmente na próxima sexta-feira (14/3), na cidade de São Paulo, e conta com os seguintes patrocínios de empresas na área de saúde, conforme revelado pela coluna:
- Mindray – a empresa chinesa é uma das principais fornecedoras globais de instrumentos médicos, mantém parceria com dezenas de hospitais brasileiros e capitaneia eventos de medicina no país;
- Tegma – da área de gestão logística, a empresa atua no segmento de transporte para a indústria farmacêutica. A companhia brasileira é considerada a “queridinha” entre montadores chineses presentes no Brasil; e
- Alper Seguros – além de fornecer planos de saúde e odontológico para empresas, a corretora de seguros tem um braço na área de tecnologia. Por meio da AlperTech, a empresa dispõe de “uma plataforma healthtech que permite o atendimento remoto, em grande escala, promovendo acesso à saúde e atendimento médico”.
O evento de lançamento da China Hub Brasil conta ainda com o apoio das seguintes empresas chinesas, que têm relação de investimento com laboratórios e tecnologias de saúde:
- Bank of China (BOC) – o banco tem subsidiária no Brasil e fornece linha de créditos para laboratórios e gigantes chinesas da indústria farmacêutica; e
- Huawei – a gigante chinesa de tecnologia tem implementado parcerias para promover a transformação digital na saúde brasileira; em dezembro, firmou parceria estratégica com a Associação Brasileira CIO Saúde (ABCIS).
Procuradas, as empresas não se manifestaram.
O que diz Padilha
Padilha chegou a consultar a Comissão de Ética Pública (CEP) para saber se poderia exercer o cargo de “presidente de honra” e recebeu aval positivo. A consulta, no entanto, foi enviada ao órgão colegiado no último dia 6 de fevereiro, quando ele ainda era ministro-chefe da SRI, e não avaliou a relação das empresas chinesas que participariam como financiadoras ou apoiadoras da associação. Na ocasião, já se ventilava que Padilha assumiria o cargo de chefe do Ministério da Saúde, órgão em que ele sempre acumulou bastante influência.
Além disso, Padilha alegou à CEP que não teve, enquanto ministro de Estado, “relação relevante” com a associação. Porém, além de ter recebido, ao menos três vezes, em seu gabinete, o futuro presidente da entidade, o ministro se reuniu com representantes da Huawei e de outras empresas da China.
Procurada, a assessoria de imprensa de Padilha informou que ele não vai desempenhar papel de gestão, nem “auferir qualquer tipo de rendimento”.
À coluna o presidente da Comissão de Ética Pública, Manoel Caetano Ferreira Filho, afirmou que o órgão colegiado entendeu que o cargo de presidente de honra foi oferecido ao Padilha-pessoa, e não ao Padilha-ministro. Questionado sobre as empresas chinesas que patrocinam e apoiam o evento de lançamento da China Hub Brasil, Filho acrescentou que “isso é um fato estranho à decisão da CEP”. “Não foi submetido para a gente”, ressaltou. Por fim, ponderou que a CEP poderá reavaliar a decisão.
Consultoria e parcerias públicas e privadas
De acordo com minuta do estatuto social da entidade, o China Hub Brasil vai intermediar relações de pessoas e fomentar contatos entre empresas brasileiras e chinesas, prestar serviços de consultoria, promover investimentos recíprocos e firmar parcerias públicas e privadas, bem como participar de fundos de investimento, de ações e de sociedades de “quaisquer empresas”.
Ainda segundo o estatuto, a associação vai ser financiada a partir de serviços prestados para os associados; de ações e sociedades em empresas e arranjos negociais; de aplicações no mercado de capitais; e da venda de ativos.
O documento não deixa claro, contudo, quais funções serão desempenhadas pelo presidente de honra. A própria Comissão de Ética Pública, porém, entende que Padilha poderá atuar como representante institucional em cerimônias e eventos oficiais e integrar reuniões de caráter consultivo junto à diretoria executiva, “contribuindo com experiência e prestígio para a tomada de decisões estratégicas”.
A Lei de Conflito de Interesses (Lei nº 12.813/2013) proíbe o exercício de atividade, por autoridades do governo federal, que “implique a prestação de serviços ou a manutenção de relação de negócio com pessoa física ou jurídica que tenha interesse em decisão do agente público ou de colegiado do qual este participe”.
O convite do evento de lançamento do China Hub Brasil é descrito como uma noite que marca o “início de uma nova fase nas relações Brasil-China, conectando líderes, empresas e instituições para abrir caminhos em negócios, inovação e cooperação estratégica”.
Quem está à frente do China Hub Brasil
O fundador do China Hub Brasil é o empresário Youyang Jiang, que também é secretário-geral da Associação Chinesa do Brasil (entidade filantrópica) e já foi recebido pelo menos três vezes no gabinete do então ministro-chefe das Relações Institucionais, além de ter participado da posse de Padilha no cargo, em janeiro de 2023.
“Participei dessa grande posse do Alexandre Padilha pelo convite do próprio ministro”, escreveu Jiang, em uma rede social, ao postar fotos no Palácio do Planalto ao lado do petista.
Em entrevista à coluna, Jiang evitou chamar de lobby a atividade da associação, mas admitiu, sim, que vão fazer o trabalho de relações governamentais e que atuarão para fazer “conexões”. “Eu não posso prejudicar nenhum amigo meu, qualquer amigo”, declarou. “Não entendo todas as coisas, mas temos os parceiros brasileiros que entendem. Tecnicamente não entendendo nada, mas tenho muitos amigos, que fazem os trabalhos e conseguem ajudar”, completou.
O futuro presidente da China Hub Brasil evitou dar detalhes sobre as atividades do ministro na associação e se ateve a dizer que Padilha será presidente de honra. Jiang garantiu que o ministro não participará de negociações e que sempre consultarão o jurídico da entidade sobre as limitações de Padilha.
O empresário explicou que fez o convite para o ministro de Lula ainda neste ano, antes de ele ser indicado para a pasta de Saúde, no lugar de Nísia Trindade. “Quando ele estava na SRI, ele sempre participou das nossas atividades da comunidade chinesa.”
“Vale a pena reforçar: o China Hub Brasil não tem ideologia política. Não é de esquerda, não é de direita. A gente conversa com todo mundo. Com todo mundo. A gente tem muitos amigos. Não temos ideologia de nada”, frisou. “Pessoalmente, eu adoro o Padilha”, completou.
Quem mais apoia e patrocina o evento com Padilha
Gigantes da área de infraestrutura e energia, como a CGN Brazil Energy, e a estatal chinesa, CEEC Energy China, também apoiam a China Hub Brasil. Completa a lista também a montadora GWM.
Pelo lado brasileiro, o evento conta ainda com apoio institucional do próprio governo federal, por meio do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDESS), mais conhecido como Conselhão, que está sob guarda-chuva do Ministério de Relações Institucionais (SRI), que era comandado por Padilha desde janeiro de 2023. O colegiado é composto de membros da sociedade civil, como ativistas, intelectuais, sindicalistas, economistas, influenciadores digitais e empresários de vários segmentos da economia brasileira.