A imagem de uma Arara Azul de Lear morta sob um poste de energia, após eletroplessão nos fios da rede, rodou a internet na última semana, provocando comoção, revolta e tristeza. Não era a primeira. E, do jeito que as coisas andam, está longe de ser a última.
Somente neste ano, até o mês de julho, já foram 24 Araras encontradas mortas após contato com a rede elétrica não protegida na região do Raso da Catarina. O número, por si só, já é alarmante. Mas, segundo o Projeto Jardins da Arara de Lear, essa conta pode dobrar até o fim do ano, chegando a mais de 50 indivíduos perdidos – isso, claro, considerando apenas os casos registrados. O número real, segundo os membros do projeto, é certamente maior e subnotificado, já que muitas aves feridas ou mortas sequer são localizadas.
A Arara Azul de Lear é uma espécie endêmica, rara e ameaçada de extinção, encontrada praticamente só aqui, na Caatinga baiana, em áreas como Euclides da Cunha, Monte Santo, Canudos e Jeremoabo. É um símbolo da nossa biodiversidade. Cada indivíduo morto é uma perda irreparável para a espécie, para a ciência e para o nosso patrimônio natural.
Desde 2020, o projeto Jardins da Arara de Lear vem denunciando sistematicamente as mortes ao Inema, ao Ministério Público Estadual (MPE) e à empresa concessionária de energia, responsável pela região. Diversas reuniões já foram realizadas com o Ministério Público, que acompanha o caso de perto. Algumas modificações técnicas foram implementadas, o que reduziu parcialmente o ritmo das mortes. Mas a solução definitiva nunca chegou.

Mais de 160 Araras mortas em cinco anos. Esse é o resultado da lentidão, da burocracia e da negligência de uma empresa que ainda não entendeu — ou finge não entender — a gravidade do problema. Em nota pública, os responsáveis pela iniciativa Jardins da Arara de Lear reafirmaram que, mesmo diante da repercussão nacional e da cobrança constante da comunidade científica e da imprensa, a concessionária segue protelando ações mais amplas e eficazes.
A comunidade local, especialmente em Euclides da Cunha, tem se unido ao projeto em uma verdadeira missão de resgate, identificação e denúncia. É a própria população que vem recolhendo as aves mortas, notificando o Ministério Público e lutando para preservar o pouco que ainda temos. Fica a pergunta: por que uma empresa multinacional e multimilionária precisa ser lembrada, a cada nova morte, de que também tem responsabilidade ambiental?

Não se trata mais de um problema técnico. Trata-se de compromisso, de ética, de respeito à vida. E também de respeito à comunidade que convive com essas Araras todos os dias, que as vê cruzando os céus da Caatinga e que chora cada perda como se fosse um ente querido.
O Euclides Diário se soma à voz da comunidade e cobra: chega de medidas paliativas. É hora de ações concretas. É hora de proteger, de verdade, a Arara Azul de Lear — antes que ela desapareça da nossa paisagem e sobreviva apenas em fotografias e postagens de luto.
A pergunta que fica é: quantas mais precisarão morrer até que algo, de fato, seja feito?
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