A Bahia voltou ao noticiário policial e político com a abertura, pelo Ministério Público, de um inquérito civil para apurar possíveis vantagens indevidas recebidas por Márcia Telles, ex-diretora-geral do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA). O caso, instaurado em 5 de agosto de 2025, é desdobramento da Operação Ceres, que já denunciou oito pessoas por fraudes milionárias no licenciamento ambiental entre 2018 e 2024, supostamente mediante pagamento de propinas que somam ao menos R$ 16,5 milhões. Um episódio que reforça a percepção de que, no Brasil, a lei existe, mas sua aplicação é frágil diante de redes de corrupção enraizadas no poder.
No Brasil, os órgãos de fiscalização ambiental estão entre os mais assediados por grandes empresas e pessoas muito poderosas, que acreditam poder tudo porque dispõem de dinheiro para “comprar” vontades e influências. Essa realidade é ainda mais perceptível nos municípios do interior, onde proliferam loteamentos irregulares ou clandestinos, desmatamento ilegal e ocupações em áreas de preservação permanente. Mesmo quando os gestores têm pleno conhecimento dessas irregularidades, a regra é fazer vista grossa, seja por conivência ou por interesse próprio e deixar de aplicar multas ou embargar obras, permitindo que crimes ambientais se consolidem.
A conduta de um gestor público nessas circunstâncias encontra enquadramento direto na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992). A lei prevê três eixos principais de responsabilização: enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e violação a princípios da Administração Pública. Tanto a corrupção quanto a omissão deliberada diante de crimes ambientais podem configurar improbidade.
O Código Penal também tipifica condutas ligadas à corrupção, como a corrupção ativa e a corrupção passiva, ambas puníveis com reclusão e multa. Porém, a mera existência da lei não basta: sem fiscalização efetiva, autonomia de órgãos de controle e agilidade processual, esses crimes permanecem impunes. O resultado é um ciclo perverso em que empresas e indivíduos poderosos agem como se estivessem acima da lei, certos de que, no máximo, enfrentarão um processo que se arrastará por anos.
Enquanto não houver transparência total nos processos administrativos, fiscalização técnica e independente e punição exemplar para quem lucra com a destruição ambiental e o desrespeito à lei, veremos repetir-se o mesmo roteiro: irregularidades toleradas, criminosos no comando e gestores públicos que, por ação ou omissão, alimentam a sensação de que, no Brasil, a lei é um obstáculo facilmente negociável para quem pode pagar. O caso Márcia Telles é apenas mais um retrato de um problema muito maior e muito mais próximo do nosso cotidiano do que gostaríamos de admitir.
DRª MARLENE REIS
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