Ao falar de Meio Ambiente e Sustentabilidade, a recuperação e reflorestamento de áreas degradadas e o manejo responsável dos recursos naturais são temas pujantes. No estado da Bahia, em que três biomas, Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga, lutam por sobrevivência, as empresas de base florestal crescem, unindo iniciativas socialmente direcionadas e um mercado com demanda crescente.
Em 2024, os produtos florestais representaram 22,44% das exportações baianas, conforme dados da plataforma Agrostat, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). No dia em que se celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente (5), o Bahia Notícias explora o impacto de iniciativas sustentáveis que não se apresentam apenas como soluções socialmente engajadas, mas projetos financeiramente atrativos.
Um bom exemplo de rentabilidade-sustentável é a Symbiosis, empresa florestal com base na Bahia. O projeto, que recebeu um financiamento de mais de R$ 77 milhões do Fundo do Clima, por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), utiliza o manejo de espécies nativas da Mata Atlântica para unir o reflorestamento de áreas degradadas e a venda dos produtos de madeira, além dela própria, como a muda e o material genético. A empresa está sediada em Trancoso, distrito de Porto Seguro, na Costa do Descobrimento.
Um dos diretores do projeto, Alan Batista, conta ao Bahia Notícias que o olhar para a flora baiana é parte do da visão embrionária do projeto. “A Mata Atlântica é um é um bioma grande. É a casa da maioria dos brasileiros, 130 milhões de brasileiros moram na Mata Atlântica. Então, a gente decidiu pelo extremo-sul da Bahia por alguns motivos. Ali que começou a destruição da Mata Atlântica, e é ali que a gente pensou em começar a reconstrução”, afirma.
Para eles, a escolha, além de simbólica, também é técnica: “E tem outros fatores também que são super importantes para nossa atividade, que é a disponibilidade de áreas degradadas, desmatadas, a gente só trabalha em áreas que estão degradadas para gente recuperar. Tem uma disponibilidade de chuva, de precipitação, que é um fator primordial para nós. Então, o sul da Bahia tem um clima muito mais estável do que muitas outras regiões do país. E tem ali a infraestrutura também. Você tem estrada, você tem portos. Então, várias questões que contribuíram para gente estar na Bahia”, detalha.
Foto: Sede da Symbiosis em Trancoso, na Bahia / Divulgação
Para Alan, que é engenheiro florestal de formação, a silvicultura – a praxis do cultivo, gerenciamento e manutenção florestal – agrega valor ao estado além da economia. Ele explica que a “domesticação” das espécies nativas também ajuda a proteger o material genético das espécies.
Essa domesticação ocorre por meio da seleção de fragmentos naturais, partes de plantas da mata original, que após o plantio serão consideradas “árvores-mães”, de onde serão retirados os materiais genéticos que permitem o melhoramento genético, por meio de cruzamentos. Batista revela que a Symbiosis já registrou 2.000 matrizes de “árvores-mães”, garantindo cerca de 30 famílias diferentes de cada espécie.
“Você pega os melhores [fragmentos] e colocam eles para cruzarem entre si, polinizar entre si. E as sementes que nascerem disso são sementes melhoradas. Então, eu quero dizer que gente, no final das contas, tá fazendo uma reserva genética. E isso é muito importante, é um legado que a gente deixa para o país. A gente tem um banco genético do Brasil, onde, por exemplo, se alguém quiser fazer uma restauração, repovoar uma área com Pau-Brasil, tem como buscar isso nas nossas áreas. Então isso é uma riqueza muito grande, que é intangível”, explica.
Um projeto de médio e longo prazo, o diretor conta que os resultados começam a chegar a partir dos primeiros 5 a 8 anos, ainda que algumas mudas levem mais de 20 anos para amadurecer. Ao falar de mercado, Alana destaca que um dos principais desafios de “vender” o projeto é justamente a responsabilidade ambiental.
Considerando o histórico brasileiro, em que a exploração ilegal de madeira na Amazônia já chegou a representar 40% do material que circula no país – segundo estudo conduzido pela Rede Simex de 2022 -, a credibilidade dos empreendimentos florestais, por mais rígidos que sejam, entra em cheque. “Historicamente, nos últimos 20 anos, o Brasil tem diminuído sua participação no mercado de madeira tropical. Eu acho que a principal variável aqui é reputação. Converso com alguns potenciais clientes e eles falam: ‘Olha, eu não quero mais mexer com [flora] nativa, porque tem um risco grande, eu não consigo garantir a cadeia de custódia, a rastreabilidade dessa madeira’, então, a gente sabe que tem um componente de legalidade muito grande”, afirma.
Mas para o engenheiro, a legalização e os registros ambientais ajudam a acessar um dos principais mercados mundiais. “Tem um mercado muito grande que a gente pode absorver. A madeira é um dos maiores mercados do mundo. O mundo consome, eh em média 1/2 m³ por habitante por ano, ou seja, 4 bilhões de m³ de madeira são consumidos todo ano. E o Brasil tem uma participação ínfima. E tem um espaço grande para gente crescer, porque você consegue provar cadeia de custódia do seu produto, porque é plantado, é certificado, e o FSC traz uma bastante robustez, transparência para esse processo”, define Batista.
Foto: Fazenda Symbiosis, na Bahia / Divulgação
Alan ainda define que, em 10 anos de projeto, mais de R$ 100 milhões já circularam através das ações da Symbiosis. “Já investimos mais de 100 milhões de reais na produção de floresta, na formação de time e na produção de mudas. Hoje a gente tem um viveiro com capacidade de produção de 5 milhões de mudas por ano. Então é um [capital de] giro bastante grande. A gente faz venda de mudas e deve começar muito em breve, a comercialização de créditos de carbono também e da madeira. Então, eu acho que diversificação é algo muito importante para os nossos acionistas e também para o desenvolvimento regional”, garante.
O Bahia Notícias conversou ainda com Wilson Andrade, representante da Associação Baiana das Empresas de Base Florestal (ABAF), para compreender o impacto econômico do setor. O gestor revela que o eucalipto é a principal espécie explorada pelos produtores baianos, ainda que as espécies nativas também sejam aproveitadas, especialmente as frutíferas.
Wilson defende que a rentabilidade-sustentável “é o caminho” para o fortalecimento do segmento. “É o caminho para este novo mundo verde que nós estamos ajudando a construir. E o setor de base florestal é fundamental e exemplar em todos os quesitos. A gente pode detalhar as vantagens ambientais, econômicas e sociais do setor de árvores plantadas, por exemplos, nós usamos 1% do território da Bahia, mas abastecemos oito segmentos com madeira e com isso, você alivia a pressão sobre a mata nativa”, ressalta.
Como já citado por Alan, o presidente da ABAF também ressalta o crescimento do mercado de crédito de carbono. Os créditos são obtidos por cada tonelada não emitida de dióxido de carbono por meio de uma certificação do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Os créditos são vendidos por países que os detém, ou seja, emitem menos do que a cota permita, para os que emitem mais e precisam de um “desconto” da emissão excedente.
No Brasil, a legislação ambiental e energética é gerida pelo decreto nº 5.882/2006, que regulamenta o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica – PROINFA. O PROINFA “visa reduzir a emissão de gases de efeito estufa, nos termos da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, contribuindo para o desenvolvimento sustentável”, segundo a regulação.
Para Andrade, esse também é um caminho de atuação para as empresas florestais, a exemplo do vínculo com as empresas de mineração. Apesar da variabilidade dos produtos e investimentos, a celulose seria o principal produto dos empreendimentos baianos. “A celulosa é usada para fazer papel, envelopes, e outros cinco mil produtos, inclusive no mercado de tecidos, com o viscose”, conta.
Foto: Divulgação / BNDES
A ABAF possui 22 empresas associadas diretamente, e outras 300 empresas vinculadas a quatro centrais regionais. Wilson afirma que as centrais regionais cobrem quatro polos de produção de produtos florestais na Bahia. “Então [em áreas de produção], temos o extremo sul, que é o polo maior; temos o litoral norte, que vai de Alagoinhas até Sergipe, que produz a celulose especial para a viscose; temos o oeste da Bahia, que a utilização é para energia e processamento de grãos; e o sudoeste, na região de Vitória da Conquista, que trabalha com várias utilidades de madeira”, afirma.
Assim como na Symbiosis, a ABAF garante que o crescimento do mercado de bases florestais é uma oportunidade grandiosa para as empresas brasileiras, tendo a Bahia como uma força regional. “A demanda de madeira no mundo cresce mais de 3% ao ano e a Bahia e o Brasil são um dos grandes produtores. Nós temos mais de 8 milhões de hectares de áreas devastadas no nosso estado, que foram pasto, então nosso setor só utiliza a área degradada, a gente não tira a mata nativa”, completa.
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