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Estudo identifica zonas ameaçadas e sem proteção em Abrolhos; regulação pode colocar Brasil no topo da meta 30×30

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Enquanto o Brasil vai a Nice, na França, para a terceira Conferência das Nações Unidas para o Oceano (UNOC), exibindo os números (aparentemente) positivos sobre a proteção dos nossos oceanos, um estudo da Universidade de São Paulo (USP), publicado na revista Ocean and Coastal Research, identificou que um conjunto de corais na região dos Abrolhos, no extremo sul da Bahia, está sendo ameaçado pelas variações climáticas e ações humanas, sem qualquer proteção ambiental. 

 

A publicação do estudo, que uniu 13 coautores, e a UNOC ocorreu em junho deste ano. Atualmente, o Brasil já protege cerca de 26% de sua área oceânica e se aproxima do cumprimento integral da meta 30×30 do Acordo de Biodiversidade, que prevê a proteção de 30% dos oceanos. No entanto, o que parece desequilibrada é a proporção e distribuição dessas áreas de proteção entre os habitats mais relevantes ou ameaçados. 

 

A região dos Abrolhos, que inclui o Banco de Abrolhos, o Banco Royal Charlotte, a Cadeia de Montanhas Submarinas Vitória-Trindade e as Ilhas Oceânicas de Trindade e Martin Vaz, abrange aproximadamente 893.000 km² de ambientes costeiros e marinhos. A região inclui estuários, manguezais, bancos de rodolitos, montanhas submarinas, ilhas oceânicas e as maiores áreas de recifes de coral do Brasil que, juntos, formam um centro de biodiversidade marinha único no Atlântico Sul.

 


Foto: Nico Ferri / PARNA Marinho dos Abrolhos

 

É o que reforça o pesquisador e co-autor do estudo, Guilherme Fraga Dutra, em entrevista ao Bahia Notícias. Guilherme Dutra é biólogo, mestre em Ecologia e atualmente atua como Diretor do Programa Oceano da Conservação Internacional, entidade que ajudou a financiar a pesquisa. 

 

“Quando a gente considera a área total, cerca de 26% da zona econômica exclusiva, ou seja, da área marinha do Brasil, estão dentro de áreas protegidas. Mas o problema é que falta representatividade. Então habitats super importantes não estão protegidos ainda, e isso precisa ser equilibrado”, explica. Ele cita os bancos de rodolitos como um exemplo. 

 

Os rodolitos são algas altamente especializadas em captura de carbono e formadoras de “mega habitats”. Um banco de rodolitos pode servir de abrigo para espécies pequenas de animais invertebrados que vão, por sua vez, servir de alimento para espécies maiores, como peixes, e como base para fixação de algas maiores, que vão alimentar peixes herbívoros. 

 

“Tem um outro estudo recente que analisou os bancos de rodolitos do Brasil inteiro, e menos de 15% desses bancos de Rodolitos estão dentro de algum tipo de área protegida, e menos de 3,5% em áreas com proteção mais restrita. E quando a gente olha para esse habitat, que é tipicamente brasileiro, é notório que ele está muito sub-representado [nas áreas de proteção] e que a gente tem uma responsabilidade grande em protegê-lo de forma mais efetiva”, conta.

 

Segundo ele, o levantamento fornece embasamento científico para que essas novas áreas protegidas sejam estabelecidas em Abrolhos, considerada a região com a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul. 

 


Foto: Enrico Marcovaldi / Projeto Baleia Jubarte 

 

“O passo seguinte é ampliar essa rede de áreas protegidas, porque a gente já viu que elas não são suficientes para poder proteger todos os habitats mapeados na região”, delimita o biólogo.

 

Além dos rodolitos, a pesquisa cita as chamadas “buracas”, como outro habitat particularmente ameaçado. As buracas são depressões na plataforma continental, formadas por processos geofísicos e biológicos, são estruturas únicas, conhecidas apenas na região dos Abrolhos. O estudo indica que essa zona está totalmente fora dos limites das atuais áreas protegidas.

 


O mapa elaborado pelo CI-Brasil ilustra as zonas de maior biodiversidade, chamadas de Hotspots de Biodiversidade, e o % de cada habitat que está protegido (em verde) ou desprotegido (em vermelho). Foto: Arquivo 

 

Dutra alega ainda que a ação de regulamentação não precisa partir, necessariamente, da União. “Um exemplo na região dos Abrolhos é a APA estadual Ponta da Baleia Abrolhos, gerida pelo Governo do Estado da Bahia, que foi criada em 1992, mas até hoje não foi implementada. Então, iniciar pela implementação de uma área como essa é um passo super importante, até porque ela tem boa parte desses ecossistemas que a gente identificou como de especial importância para a biodiversidade”, indica Guilherme. 

 

O gestor explica que a proteção das áreas não é apenas uma medida técnica, mas tem reflexos práticos na manutenção atual dessas áreas e defesa contra as mais diversas ameaças. Guilherme cita ameaças diretas, como a mineração, a exploração de petróleo, as dragagens para navegação, e as ameaças indiretas, como a pesca excessiva ou a pesca predatória, redes de cerco e os efeitos das mudanças climáticas. 

 

“E a forma mais eficiente para a proteção desses ecossistemas é com a criação de áreas marinhas protegidas, que podem ser de várias categorias, então nós temos a lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, que define essas categorias, e também a lei 9.985/2000, e a gente tem um conjunto de regras para poder seguir na proteção da área, seja com categorias que permitem o uso direto, seja em áreas mais restritivas, como os parques nacionais, que só permitem visitação”, resume o pesquisador. 

 

Dutra define ainda que o domínio da sociedade sobre o tema e a cobrança é uma das principais formas de alcançar resultados efetivos no que diz respeito ao meio ambiente. 

 


Foto: Enrico Marcovaldi / Projeto Baleia Jubarte 

 

“A sociedade tem um papel muito importante, cobrando dos governos para fazer sua parte, com a implementação das áreas protegidas atuais e com a criação de novas áreas protegidas”, define. Ele conta que pensando nessa mobilização, foi criado o coletivo Abrolhos para Sempre, que une ONGs (Organizações Não Governamentais) e a sociedade em torno do tema.

 

“Em breve esse coletivo vai iniciar campanhas para ampliar a proteção da região, e esperamos mesmo que as pessoas acompanhem e participem desse processo”, completa.


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