Arqueólogos encontraram na Caverna Scladina, na Bélgica, ferramentas multifuncionais feitas por neandertais com ossos de leões-das-cavernas. Os equipamentos têm mais de 130 mil anos e seriam como “canivetes suíços” primitivos, capazes de demonstrar a engenhosidade desses hominídeos pré-históricos.
A equipe encontrou quatro diferentes instrumentos modelados de forma intencional. Marcas como polimento por manuseio e lascas retiradas com precisão indicam um uso intenso, além de refinamento para novos propósitos. A descoberta resultou em um estudo publicado na revista Scientific Reports.
“A transformação intencional de ossos de leão em ferramentas funcionais destaca as habilidades cognitivas, a adaptabilidade e a capacidade dos neandertais de utilização de recursos além de suas necessidades imediatas de sobrevivência”, escrevem os autores na pesquisa.

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Neandertais adaptaram as ferramentas para vários propósitos
Os cientistas examinaram as peças e descobriram que todas vieram da mesma tíbia de um leão-das-cavernas. Um detalhe chamou a atenção do grupo: dois fragmentos se encaixam perfeitamente, comprovando que foram intencionalmente partidos e retrabalhados.
A equipe acredita que uma peça na extremidade do osso serviu inicialmente como cinzel, para talhar, cortar ou moldar materiais como madeira e pedra. Depois o instrumento passou por desgaste e polimento para se tornar um retocador, utilizado para moldar ou afiar ferramentas de pedra.
O estudo sugere que os neandertais escolheram intencionalmente a tíbia de leão devido a seu tamanho, formato e integridade estrutural. Os autores relatam que a sequência de etapas para produzir essas ferramentas de osso é idêntica à usada para outros instrumentos presentes na caverna.
Isso pode significar que esses hominídeos caçavam os felinos para fins práticos, como a produção de ferramentas. Porém, a equipe não exclui uma possível relação simbólica entre os neandertais e os leões, muito possivelmente existindo uma convivência reverente entre ambos.

Relação entre os hominídeos e os felinos intriga pesquisadores
As descobertas revelam mais sobre o comportamento dos neandertais e suas interações com os leões-das-cavernas. Embora tenham coexistido por milênios, pouco se sabe sobre sua relação.
Essa espécie de leão pré-histórico, cujo nome cientifico é Panthera spelaea, foi descrita pela primeira vez em 1810 pelo paleontólogo alemão Georg August Goldfuss. Seus fósseis já foram encontrados em diversas regiões da Eurásia e da América do Norte. Considerado uma subespécie extinta do leão moderno (Panthera leo), ele habitou vastas áreas durante o período Pleistoceno médio e tardio (700.000-12.000 anos atrás).
Uma pesquisa de 2023 apresentou evidencias que os neandertais caçavam e até esfolavam esses animais. Porém, o estudo atual é o primeiro a relatar ferramentas feitos com os ossos dos P. spelaea.
“Além de sua raridade, esses artefatos levam a uma reavaliação das interações dos neandertais com grandes carnívoros, enfatizando que esses animais não eram meramente competidores ecológicos, mas também podiam servir a propósitos práticos e possivelmente simbólicos nos modos de vida dos neandertais”, escreveram os pesquisadores.
A equipe pretende continuar estudando esses artefatos para encontrar outros possíveis usos. A comparação com achados de outros sítios poderá fornecer informações sobre a produção de ferramentas na pré-história, além de dar novas pistas sobre a complexa relação dos neandertais com os diversos animais em seu ecossistema.
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