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Hugo Motta emprega caseiro de fazenda em seu gabinete na Câmara dos Deputados

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O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos), emprega em seu gabinete o caseiro de sua fazenda em Serraria (PB), cidade de 6.000 habitantes a 131 km de João Pessoa e a 225 km de Patos (PB), sua base eleitoral.

Ary Gustavo Soares é contratado como assessor do gabinete do parlamentar desde 2019. Atualmente, recebe R$ 7.200 em salários e auxílios pagos pela Câmara.

Ele ocupa o cargo de secretário parlamentar, que prevê 40 horas semanais e dedicação exclusiva, o que significa que o funcionário precisa trabalhar oito horas diárias e não pode ter nenhum outro trabalho público ou vínculo privado incompatível com a atividade parlamentar, segundo lei e normas da Câmara.

Procurado por meio de sua assessoria de imprensa desde quarta (13), Motta não se manifestou.

A Folha viajou até Serraria e conversou com funcionários atuais e antigos da fazenda, vizinhos e técnicos agrícolas que trabalham na região. Todos confirmaram que Ary trabalha como caseiro na propriedade.

Ele também figura em processo trabalhista movido contra a fazenda de Motta, respondendo como preposto da propriedade.

De acordo com o ex-funcionário Antonio da Costa, que foi tratorista no local até junho de 2023, o caseiro costuma chegar ao local no início da semana e fica até sexta-feira, dormindo na casa principal da propriedade.

Ele contou que o funcionário de Motta volta nos fins de semana para Patos, onde vive com sua família. Costa relatou que, como tratorista, recebia todas suas ordens diretamente de Ary.

O ex-tratorista processou a fazenda no segundo semestre de 2023, após ser demitido, por não ter carteira assinada. Ary foi o representante do empregador no processo. Costa venceu a ação e recebeu R$ 18 mil.

A reportagem foi na tarde da última terça-feira (12) até a entrada da fazenda, uma porteira azul às margens da rodovia PB-085. O caseiro tinha chegado poucas horas antes, por volta das 13h, vindo de Patos.

A Folha conversou com Ary pelo telefone de uma funcionária que fica na porteira da propriedade. O caseiro se recusou a sair do local, não quis responder às perguntas da reportagem e disse que qualquer assunto relativo à fazenda deveria ser tratado com Motta.

Essa funcionária, que se identificou apenas como Maria, confirmou que Ary trabalha na fazenda. “Ele passou aí já mais cedo hoje”, respondeu ao ser questionada se ele estava na propriedade.

O mesmo foi relatado por Juliana de Lima, funcionária da agência de extensão rural da Paraíba, que presta assistência para as fazendas locais.

Para entrar na fazenda, explicou, é necessário falar com Maria, que liga para Ary, que é quem autoriza a entrada na fazenda. “O pessoal lá é isolado”, acrescentou.

Além disso, um dos vizinhos da propriedade, que preferiu não se identificar, disse que quando tem questões a resolver com a fazenda de Motta, lida com Ary.

Cada deputado tem direito a uma verba de gabinete de R$ 133 mil por mês para contratar de 5 a 25 secretários parlamentares. Eles ganham entre R$ 1.584,10 e R$ 18.719,88, além de auxílio-alimentação e outras gratificações.

O trabalho desses funcionários é regido por uma lei, atos e regulamentos que estabelecem o tipo de trabalho vinculado à atividade parlamentar, o regime de dedicação, a carga horária e a limitação ao exercício de outras funções.

O ato da Mesa da Câmara dos Deputados 72, de 1997, diz, no artigo primeiro, que o cargo de secretário parlamentar tem por finalidade a prestação de serviço “direto e exclusivo” nos gabinetes para atendimento de atividades parlamentares.

O site da Câmara dos Deputados lista como impeditivo para exercer o cargo “possuir vínculo empregatício com empresa privada e/ou desempenhar quaisquer atividades em local e horário incompatíveis com o exercício do cargo em comissão”.

Já a lei 8.112, de 1990, que disciplina o regime jurídico dos servidores públicos, proíbe que funcionários exerçam outras atividades, o que inclui a atuação privada, “que sejam incompatíveis com o exercício do cargo ou função e com o horário de trabalho”. Ary, segundo os relatos de testemunhas, passa quase toda a semana na fazenda.

Por sua vez, o ato da Mesa 24, de 2015, determina que funcionários da Câmara estão sujeitos à jornada ordinária de trabalho de 8 horas diárias e 40 horas semanais. Secretários parlamentares lotados nos estados de representação dos deputados podem cumprir jornadas de trabalhos estabelecidas por seus chefes.Pelas regras desse tipo de cargo, o secretário parlamentar não tem a obrigação de bater ponto presencialmente na Câmara.

Segundo políticos locais ouvidos pela Folha em Patos, Ary trabalha como motorista do presidente da Câmara na cidade, berço político do parlamentar, nos fins de semana. Durante a semana, quando Motta está em Brasília, cuida da fazenda.

O anexo do ato da Mesa 58, de 2010, estabelece que, na condição de assistente ou auxiliar, os secretários parlamentares podem conduzir veículos e prestar outros tipos de apoio. Qualquer função, no entanto, permanece submetida à exigência de “atendimento das atividades parlamentares”, sem permissão de atender a questões particulares do deputado.

Motta comprou a fazenda em março de 2023 por R$ 2,7 milhões, como revelou o portal UOL. Antes, ela pertencia ao ex-senador Raimundo Lira (Republicanos-PB).

A fazenda está registrada no nome de uma empresa que pertence à mulher do presidente da Câmara, Luana Motta, e a seus dois filhos, a Medeiros & Medeiros Ltda.

O local é a sede da Agropecuária Tapuio, nome fantasia de uma empresa do parlamentar, a Hugo M Wanderley da Nobrega Ltda. Foi essa empresa que Antonio da Costa processou para ter seus direitos trabalhistas reconhecidos.

A família do presidente da Câmara também emprega em cargos públicos dois parentes do caseiro.

A mulher dele, Isabella Perônico, tem um cargo no gabinete da avó de Hugo Motta, Francisca Motta. Seu salário é de R$ 14,3 mil mensais.

O irmão de Ary, André Guedes, é superintendente da PatosPrev, entidade que administra a previdência dos funcionários dessa área da cidade. Ele recebe R$ 13 mil por mês. O prefeito de Patos, responsável pela nomeação de André, é Nabor Wanderley, pai de Hugo Motta.

Em julho, a Folha revelou que Motta mantinha em seu gabinete na Câmara dos Deputados três funcionárias fantasma: a fisioterapeuta Gabriela Pagidis, a assistente social Monique Magno e a estudante de medicina Louise Lacerda.

Depois que a reportagem procurou Motta para ouvi-lo sobre o caso, Pagidis e Magno foram demitidas. Lacerda continua trabalhando no gabinete de Motta. Ela é filha e sobrinha de dois aliados do presidente da Câmara no seu estado natal.

Na ocasião, Motta afirmou que “preza pelo cumprimento rigoroso das obrigações dos funcionários de seu gabinete, incluindo os que atuam de forma remota e são dispensados do ponto dentro das regras estabelecidas pela Câmara”.

Fonte: política livre


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