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Quebras de sigilo e WhatsApp: a investigação que levou à megaoperação

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Quebras de sigilo e WhatsApp: a investigação que levou à megaoperação
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A investigação que culminou na megaoperação realizada na terça-feira (28/10), que deixou 121 mortos e é considerada a mais letal da história do Rio de Janeiro, começou ainda em 2024, a partir de uma denúncia anônima feita pelo disque-denúncia.

O alerta indicava que, no interior do Complexo da Penha, integrantes da facção criminosa Comando Vermelho (CV) planejavam a expansão do poder territorial.

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Situado na zona norte da capital fluminense, a área reúne 13 favelas e cerca de 100 mil habitantes. Segundo autoridades, o território é marcado por barricadas e intensa presença de pontos de venda de drogas, que se estendem para áreas que antes eram de livre circulação.

Ao longo da apuração, os agentes mapearam a hierarquia do grupo. No topo, está Edgar Alves de Andrade, vulgo “Doca” ou “Urso”, responsável por comandar o Complexo da Penha e diversas outras comunidades.

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Considerado o número 2 do CV, Doca é apontado como responsável por guerras expansionistas que resultaram em invasões de regiões de Jacarepaguá, como Rio das Pedras e Muzema. De acordo com a investigação, ele possui 269 anotações criminais e 26 mandados de prisão pendentes, envolvendo crimes como tráfico de drogas, tortura, roubos e associação criminosa.

Embora Doca fosse um dos principais alvos da operação de terça, ele conseguiu escapar e segue sendo procurado.

Imagem colorida de cartaz do Disque Denúncia que oferece recompensa por Doca - Metrópoles
Cartaz do disque-denúncia que oferece recompensa por Doca

Aliados de Doca, líder do Comando Vermelho

O líder também conta com aliados de extrema confiança. Carlos da Costa Neves, o “Gardenal”, é uma espécie de “gerente geral do tráfico” na Penha e lidera a expansão do grupo. Washington César Braga da Silva, conhecido como “Grandão” ou “Síndico”, atua como gestor, montando escalas de plantão, orienta pontos de contenção armada e controla atividades recreativas nas comunidades.

“BMW”, vulgo de Juan Breno Malta Ramos, é executor da facção, responsável por punir e intimidar integrantes que desobedecem ordens.

Pedro Paulo Guedes, o “Pedro Bala”, também tem posição de comando, passando orientações inclusive para Gardenal, enquanto Eduardo Lisboa de Freitas, o “Du Mec” controla o fluxo de dinheiro da organização e analisa o recebimento de drogas.

Quebras de sigilo

Um dos fatores que ajudaram a Polícia Civil no mapeamento do CV foram quebras de sigilos, que somam mais de três terabytes de dados telemáticos recebidos do Google e da Apple. Dentre as descobertas, a partir de informações constantes nos celulares de suspeitos, estão grupos em que membros da facção falavam sobre o gerenciamento do crime.

Neles, eram organizadas escalas de plantão, definidas estratégias de venda de drogas, monitoramento de viaturas e até ordens de execução. Esse acesso permitiu detalhar a atuação individual de cada integrante e como a facção mantém disciplina e controle sobre a comunidade.

“Conforme já destacado os grupos de Whatsapp são criados, não apenas para comunicação entre os integrantes, mas, mais do que isso, para a gestão da facção criminosa, estando todos os integrantes associados a mesma. Nestes grupos, os líderes do tráfico emitem ordens de caráter geral, ordens sobre a comercialização de drogas para os subordinados, determinam as escalas de plantões, sejam em pontos de comercialização de drogas (bocas), pontos de visão (monitoramento) ou pontos de contenção (segurança armada). Também chamam atenção de seus subordinados, falam sobre veículos roubados, monitoramento de viaturas policiais, contabilidade das vendas de drogas e até sobre a execução (morte) de rivais”, diz trecho do documento, enviado à justiça no início de 2025.

Tais diálogos presentes nos grupos e as trocas de mensagens, apresentados no relatório em dezenas de prints, mostram a dinâmica dos criminosos e suas condutas individualizadas na facção.

 

Indícios de tortura e violência

A investigação também revelou indícios de tortura e violência por parte do Comando Vermelho. Em alguns casos, segundo a apuração, pessoas que brigavam em bailes na comunidade eram expostas a banhos de gelo.

“Para aquelas que brigam em dia de baile na comunidade, foi criada uma nova forma de punição, anteriormente, raspar os cabelos das mulheres era o padrão. Conforme imagem, o banho de gelo passou a ser prática recorrente”, diz o relatório.

Outro episódio citado é um vídeo em que um homem aparece sendo arrastado por um carro, amordaçado e algemado por cerca de sete minutos para que confessasse, segundo a Polícia, participação em uma delação a um grupo rival.

Complexidade do controle da facção

A operação policial também evidencia a complexidade da facção, que mantém vigilância estratégica, controle de câmeras de segurança e patrulhamento, dificultando a atuação da polícia.

Tal dificuldade das autoridades de adentrar nos Complexos, como mostrou o Metrópoles, foi usada de justificativa pela Polícia Civil para explicar à Justiça suposta demora em deflagrar a operação. Segundo a corporação, a atuação na área era de “elevada complexidade logística e operacional”.

“As diligências determinadas por este Juízo nos autos ainda não foram efetivamente cumpridas em razão da elevada complexidade logística e operacional envolvida para a realização da medida investigativa no local de interesse, situado em área reconhecidamente conflagrada e sob domínio territorial de facção criminosa Comando Vermelho”, informou a Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE).

O resultado da investigação se materializou na megaoperação de 28 de outubro, com 121 mortos, mais de 100 prisões e apreensão de armas e drogas. Moradores relataram clima de medo e tensão, enquanto autoridades destacaram a importância da ação contra o CV.

Há, nessa mesma esteira, versões conflitantes sobre a ação policial. Enquanto o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), afirma que a operação foi um “sucesso”, organizações da sociedade civil repudiaram mortes e órgãos, como a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, apontam possível violação de direitos.

Embora passados dias da operação, há ainda perguntas sem resposta, como os impactos da estratégia utilizada pelos agentes, chamada de “muro do Bope”, para encurralar criminosos do Comando Vermelho e a dúvida que paira sobre as gravações das câmeras corporais dos agentes, que, segundo o secretário da Polícia Militar do Rio, podem não ter gravado parte da ação

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